Quando se afirma que a eleição legislativa de Eunápolis deveria ser anulada, porque viciada, portanto, ilegal, se faz à luz da legislação, de princípios democráticos, da cultura política e da perspectiva histórica também. De tal forma, uma simples investigação da Polícia Federal, por conta da implicação dos recursos federais do Sistema Único de Saúde (SUS), que estão em jogo, provavelmente colocará em xeque todo o pleito legislativo. O problema é que deixaram de lembrar aos que se fingem de ignorantes que o SUS é intocável. Que ninguém pode mexer com recursos do SUS, por conta da sua destinação constitucionalmente vital.
Neste município houve a prática ilícita conhecida por “compra programada de votos”, da qual se conhece a dinâmica. Entretanto, a imprensa não conseguiu e também para efeitos jurídicos, não se conseguiu ainda uma prova robusta da usurpação dos recursos do SUS para fins político-eleitorais escancaradamente como ocorre em Eunápolis. Fato é que a eleição em questão carece de legitimidade e deve ser anulada, com o TSE convocando uma nova eleição sob rigoroso controle do judiciário e atuação do Ministério Público Eleitoral.
Trata-se de assunto muito sério, para o qual as entidades e instituições não deram a devida atenção, em desrespeito a todos os códigos de que se tem conhecimento. Não há nada mais essencial no processo eleitoral e na democracia do que a paridade de armas na disputa. Esta foi uma quebra inaceitável do processo político local.
A Justiça Eleitoral deveria ter eliminado as práticas que afetariam a paridade das armas. Elas eram de conhecimento de todos. Os agentes abusaram da confiança da administração, enganaram sistematicamente o povo, prejudicaram os concorrentes e a democracia. Ao mesmo tempo trata-se de abuso de poder econômico e político (art. 14, §9º, da Constituição Federal; art. 237 do Código Eleitoral; art. 19 da LC nº 64/90 e art. 22 da LC nº 64/90).
O que aconteceu em Eunápolis era previsto de longe. A cada eleição repetem-se notícias que candidatos, partidos, coligações e agentes públicos praticaram atos de corrupção e de abuso de poder para conseguir o sucesso nas urnas. O mais grave dessa infeliz reincidência é que muitos desses abusos são cometidos com uso do Poder Público, como é o caso de Eunápolis.
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Ora, senhores! um dos princípios que norteiam o Direito Eleitoral é a igualdade de condições aos candidatos, o que se convencionou nominar de “pars conditio”, cuja força normativa deriva do que dispõe o art. 5º, caput; outra vez o art. 14 da CF/88; os arts. 36-A, I e 73 da Lei nº 9.504/1997, entre outros.
O princípio da paridade de armas, que há algumas semanas venho argumentando como base para uma eleição legítima em qualquer lugar, é o instrumento de uma eleição isonômica, na qual nenhum concorrente pode ter vantagens além do previsto na lei. Entre outros, este princípio baseia o equilíbrio da propaganda eleitoral e de institutos como o afastamento legal, que versa sobre o afastamento de candidatos profissionais da mídia de seus locais de exposição no período pré-eleitoral, que não chega a ser vantagens tão fortes e influentes quanto à que questionamos e condenamos no cenário eunapolitano, qual seja, a compra programada de votos pela qual o candidato usou serviços da Saúde Pública e do Detran para se eleger.
Essa modalidade de compra de votos não é fato novo no cenário baiano. Contudo, este fato de Eunápolis traz elementos que tornam o executor do procedimento em si, um candidato imbatível quando usufrui da ilegalidade que é usurpar os serviços públicos em seu favor. O pior disso é que eles cometem as irregularidades nas barbas de entidades e instituições da sociedade, de tal forma que a população chega a acreditar que as cirurgias encaminhadas pelos vereadores e as carteiras de habilitação facilitadas são ações legais. Eunápolis deve dar uma olhada nas suas coisas públicas, antes que seja tarde.
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